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“A Poesia como reino preservado da revoluçäo permanente da realidade, a Poesia como “em si” e os poetas deuses-pastores desse novo Trianon säo uma ficçäo. A tentaçäo é permanente de trocar os pés de argila pelas asas de plástico, mas o voo é imaginário. O mundo onde passeiam é uma “noutra parte”, uma “transcendência” ilusória, cujos muros säo palavras magníficas mas exangues por terem perdido o contacto com o mundo como eles mesmos o perderam.
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A Poesia pode ser descrita como “encarnaçäo sensível do Infinito no infinito” com uma condiçäo: a de näo fazer um em si, um Objecto, mesmo pensado como Deus, desse famigerado Infinito, mas de ver nele apenas o que ele representa para nós, a saber, “a própria existência humana, inobjectivável em sua essência”. Absurdo e inútil buscar no espaço a intuiçäo sensível para preencher o conceito de Infinito. Ela está mais próxima, täo próxima que näo pode distinguir-se e o que nós chamamos vida humana é a face externa dessa realidade näo-finita que nós somos. Esta näo-finitude é todo o seu conteúdo. Designá-la como Infinito é já perdê-la. A Poesia exprime essa aproximaçäo de nós mesmos que jamais pode ser perfeita por definiçäo. Mais poético, mais real.”
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Eduardo Lourenço, “O irrealismo poético ou a poesia como mito”. In Tempo e Poesia.
Lisboa, Gradiva, 2003: 57-66.
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