"Somos prisioneiros, pertencemos a um lugar. Não há outro. Como o caule à raiz, o fruto à árvore, pertencemos àquilo que tocamos, sem saber porquê. E andamos à volta, porque somos isso, uma nave que se move sobre um eixo indiferente e acelera a sua marcha à medida que os anos passam e as lápides se aproximam. Acendem-se as lâmpadas, nesse terraço que imagino, mas um labirinto selvagem permanece no coração, nas suas passagens secretas, cujos portões encerram, num estranho castelo de nuvens e vapor, a nossa inamovível solidão. Se quisermos, podemos partir para as estrelas fabulosas de uma noite austral. Se quisermos, podemos plantar ao amanhecer um jardim de plantas luminosas e muito brancas, podemos vaguear perdidamente, lembrar, esquecer, recomeçar tudo o que interrompemos da última vez.".
José Agostinho Baptista.
O Pai, a Mãe e o Silêncio dos Irmãos. Assírio&Alvim, 2009. pp. 183, 184, 185.