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Se não fosse esta certeza
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que nem sei de onde me vem,
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não comia, nem bebia,
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nem falava com ninguém.
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Acocorava-me a um canto,
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no mais escuro que houvesse,
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punha os joelhos à boca
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e viesse o que viesse.
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Não fossem os olhos grandes
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do ingénuo adolescente,
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a chuva das penas brancas
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a cair impertinente,
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aquele incógnito rosto,
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pintado em tons de aguarela,
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que sonha no frio encosto
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da vidraça da janela,
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não fosse a imensa piedade
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dos homens que não cresceram,
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que ouviram, viram, ouviram,
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viram, e não perceberam,
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essas máscaras selectas,
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antologia do espanto,
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flores sem caule, flutuando
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no pranto do desencanto,
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se não fosse a fome e a sede
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dessa humanidade exangue,
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roía as unhas e os dedos
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até os fazer em sangue.
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António Gedeão
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