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Baseado no trabalho disponível em http://sulmoura.blogspot.pt/.

quinta-feira, maio 18, 2006

manuscritos, maria t

.

.manuscrito da Fala.

.

.a luz lenta dos areais

.incumbiu-TE o manuscrito da Fala.

.

.Grânulos de marfim

.Conchas, vitrais

.Do multiplicar do breu em espera

.Do prisma do tudo côr que a côr encerra,

.Marfins evaporando delírios

.Roxos de algas evaporadas,

.Carícias do lunar no sol,

.Lábios desaguados, enseadas

.- húmus, espumas, escamas por vir -

.prostraram-se, no silêncio, na palavra

.no multiplicar de toda a côr,

.no evaporar do breu em espera:

.urgiam-TE o manuscrito da Fala.

.

.dos voos ansiantes de gaivotas

.traduzi ser o Lugar

.essa a planura;

.afaguei os gatos de orientes

.afaguei a tartaruga e a formiga

.num esvoaçar a mão virou papoila

.e borboleta de asas aturdidas

.

.desci dois dos degraus do precipício

.e cruzei-me com minha forma cisterna,

.dois lances de mármore abaixo

.eram suspiros

. - soltavam os que não dera -,

.desencaracolada a escada vã

.um sopro elevava-me os vestidos

.soltos, das mãos; fechados, vivos

.postigos entreabriram

.a despedida da espera.

.

.cumpri as vénias exigidas

.de oscilar um riso comedido,

.pelo cordão de dúvidas e mentiras

.irompi, num passo presumido,

.meneei « - boas-vindas!» de boas-idas

.a esburacados corações ressentidos.

.

.soltei pétalas por latinizar

.nos cânones de lentes emurchecidos

.

.pela pérgola dos Desastres de Amor

.fui consolando bustos e sentidos

.

.entrei no Derradeiro corredor

. - dos sonhos plenos, não atingidos -

.e arfei no Corpete da Verdade

.que, teimaste, vestiria sem pruridos.

.A escadaria lívida e aliviada

.Me entregou inteira ao Areal

.Grânulos de marfim

.Conchas, vitrais

.E os roxos evaporados em delírios

.Prostraram-se, no silêncio, teu Falar :

.Incumbiu-TE o vento do manuscrito.

.

.

.e nada mais - nem côr nem coral,

.nem ceptros, diamantes

.nem vitrais,

.nem odores pelo odor entontecidos -

.nenhum nada do tudo era vital :

.que o Vital o Nada em Tudo Cria.

.

.Urgiam-TE o manuscrito da Fala

.Da Fala de que foras incumbido.

.

.

.

.suspensos,

.todos os tempos sem pairar

.suspensos o desvario e o equilíbrio

.cunhaste o manuscrito

.do Vital,

.da Fala, sem palavras,

.dos sentidos

.

.

.

.suspensa

.a luz lenta dos areais

.incumbiu-NOS de sermos teu manuscrito:

.

.nos seios, nos côncavos de nós

.nos mais íntimos e líquidos abrigos

.depositaste a Fala do não dito:

.a Fala da Fala do manuscrito.

.

.

.

.

.podem, desde então, nascer migalhas

.de desejos pelos caminhos

.mas na suspensa e lenta

.luz do Dito

.nos areais dos sentidos sentidos

.

.permaneces.

.

.

.Rito dos Sinais.

.Rituais (que nos iniciaste)

.sem vestígios.

...

.

.

. O manuscrito da ENTREGA

.

.na dobra das visões te protegi.

.

.

.com lacres de espuma

.emoldurei esta alma tresmalhada.

.

.

.

.cabias redondo, ofegante.

.num murmúrio do silêncio

.me esvaí.

.doutros recantos o soro da promessa

.me recompunha em olhos e vastidão.

.Enderecei alto Muito,

.o manuscrito da ENTREGA;

.da Luz o flori, folheei,

.folheei, recortei e recomeço.

.

.

.

.a funcionária sorriu-se da urgência.

.

.outros pestanejam cumplicidades.

.

.

.

.num recanto estás escrito

.que és pra mim;

.

.do outro ressona a vaidade.

.

.

.num papel de prata

.toca-me o aqui;

.

.retalhos de notícias antiquadas

.volteiam seres-me a calamidade.

.

.

.

.emoldurei esta alma.

.

.tresmalhada

.te cobiço e alicio

.numa promessa de presenças,

.de poesia.

.

.

.

.átomos da agonia da espera

.andam por aí à solta

.sem pruridos.

.regresso à entrada da casa

.e percebo

.meus pés fugidos, fugidios.

.levo a mão à fechadura certa

.e faltam-me os dedos dos sentidos.

.olho a sacada soberana sobre a rua

.e os passos se emaranham

.nos precipícios

.do chão, da tábua que estalou

.pla mão dos espíritos sabidos.

.na chaminé oscilam caçarolas

.esvoaçam os púcaros de asas

.livres, o repolho e a abóbora

.para o canto do ausente quintal.

.o vinho risca, a sangue, o ar

.e detém-se, lívido, ao meu passar.

.de telhas encontro o leito adormecido

.e as torneiras pedem leite ao acordar.

.nas guelras do goraz

.bailam sereias

.e dos potes de barro das azeitonas

.bandoneons : « - ¡Volver!, ¡Volver!» ressoam.

.

.o doce do moscatel inaugurado

.implora, a algum pai, com Buarque:

.«este silêncio todo me atordoa

.atordoado eu permaneço atento...»

.

.já os livros rodam de mãos dadas

.falam-me as letras de que gostaste:

.tacteias, mastros, juncos e crianças :

.Eugénio em acenos gravados.

.

.

.

.recuo: ao fundo, o corredor,

.o baú do futuro me aguarda:

.ferrolhos do imenso linho

.corais de mar do norte

.teu entranhado incenso

.se exalam

.se exalam pelas frestas

.da não casa.

.

.

.

.deslizo-me: de parede me faço em algas.

.lacres de espuma, fatais, águas e risos

.me amparam.

.e minha alma

.na dobra das visões nos acasala.

.

.

maria toscano, A Utopia da Coragem. Viseu: Palimage Editores, 1999.

4 comentários:

António Simões ,Augusto Mota e Gabriela Rocha Martins disse...

sem fôlego
.
.
.
genial ... !

emedeamar disse...

sou suspeita...
gosto mt destes textos
(mas disseramn-me que escrevo há anos 50...)
(ainda ando para ver se percebo ...)

:-)

bem haja pelaS suaS visitaS sempre tão Fortes!
bem haja!
abraçobrancodeLuzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz

emedeamar disse...

"errata": disseram-me
fim da "errata"
graTa
:-)

emedeamar disse...

segunda errata E ESTE ERRO É DE PALMATÓRIAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA

"que escrevia à anos 50"
(do francês "à la...")

GRrrrr
penitencio-me

com
as minhas desculpas

já de abalada? ande cá! corra a cuartina de riscas e sente-se aí no mocho (no canapé? é melhor nã, nã seja que as preguetas lhe dêem cabo da roupa).
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faz calôrê nã? é tempo dele! no cântaro hai água fresquinha! e se quiser entalar alguma coisaaaa... a asada das azeitonas está chêinha, no cesto hai bobinha e papo-secos (com essa chôriça... ou com o quêjo de cabra, iiiisso!, nessa seladêra de esmalte!);
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chegue-se à mesa! - cuidado não lhe rebole a melancia para cima dos dedos do péi... assim... - entã nã se está melhórê?
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nã, nã, agora nã vai máinada! estou a guardar-me pra logo... ora na houvera de sêri! ah! já lhe dê o chêro! pois é: alhos e coentros e um nadica de vinagrê... vem aí do alguidar de barro... sim, sã nas carnes prá cêa.
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como nã sê o que o trouxe cá, forastêro, ‘stêja nesta sulmouradia como à da sua: pode ir mirando os links ("do monte"; "olivais..."; "deste planAlto..."; estas é que são...") os montes de que gostamos; pode ir vendo os posts por data ou esprêtando as nossas etiquêtas
("portados"); ou pode ir passando os olhos só pelos mais recentes.
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ah! repare lá que por estes lados nã temos o hábito de editarê todos os dias - não é um blogue-diário, 'tá a vêri?; pensámo-lo antes como sendo uma espécie de blogue-testemunho das vozes do Sul (o de cá e os Suis todos); mas temos ainda muito qu'arengar... vamos lá chegando, n'éi? devagarê, que o sol quêma!
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